sexta-feira, 7 de maio de 2010

O Tocador de Atabaque

(Eduardo Alves da Costa)


Querem o meu verso

De nariz para o ar,

Equilibrando a esfera,

Enquanto alguém bate com a varinha

Para me por no compasso.

Pedem-me que não seja violento

E me mantenha equilibrado

Entre a forma e o fundo,

Porque a platéia não deve sofrer

Emoções fortes.
Mas eu, nascido num tempo de sussurros,

Tenho a voz contundente

E por mais que me esforce

Não sirvo para cantar no coro.

Sei apenas tocar meu atabaque.

Assim, que me perdoem

Os amantes dos saraus

E os arquitetos de labirintos,

Que as senhoras se protejam com o xale

E os corações delicados

Se encostem à parede

Para fugir às correntes de ar.

Bato no atabaque

Até estourar os tímpanos fracos

E chamo num grito de gozo

As almas bravias,

Para dançarmos juntos,

Mordidos pela mentira do mundo,

Com os nervos envenenados

E a jugular aos pinotes.

Escutem, eu vou lhes contar a história

Do leão que tinha um espinho na pata...



Bato no atabaque e me consumo

Como se o sangue fugisse

Por um rio subterrâneo.

Vamos, o senhor não pode enganar todos

Durante todo o tempo.

Bato no atabaque

Quem quiser cantar

Que me dê um tom.

Por que ao sair do trabalho

A gente não volta para casa

De montanha-russa?

Bato no atabaque...

Matou o patrão com cinco tiros

Porque foi despedido

Sem aviso prévio.

Bato no atabaque...

Izabel acho que meu pai,

Quando souber,

Vai me bater.

Bato no atabaque...

Moço,compra uma flor

Pra namorada?

Bato no atabaque...

Você acha que eles bombardeiam a China?

Bato no atabaque

e o furacão me arranca pela raiz

e eu sou um baobá

atravessando os céus da Flórida

para cair em Nova York,

sacudindo a bolsa de valores

como um enfarte.

Não sei... prá mim

Quem matou Kenedy

Foi a reação.

Bato, bato, bato no atabaque

Até consumir o terceiro estágio

de minha alma de astronauta

e ficar girando,

fora de órbita,

para sempre.

Nenhum comentário:

Postar um comentário